Especialistas elogiam projeto de lei que moderniza o sistema de patentes brasileiro
Os gargalos na concessão de patentes no Brasil e suas consequências para o desenvolvimento do país foram discutidos, na última sexta-feira (11/11), no webinar “O desenvolvimento do sistema brasileiro de patentes de inovação proposto pelo PL 2056/2022”, promovido pelo escritório Licks Attorneys com o apoio da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee).
O evento, mediado pela Desembargadora aposentada Liliane Roriz, presidente da Comissão Especial do 5G da OABRJ e sócia do Licks Attorneys, destacou o Projeto de Lei 2056/2022, que promove mudanças na Lei de Propriedade Industrial (Lei n° 9.279) e no INPI (Instituto Nacional de Propriedade Intelectual), de forma a modernizar o sistema brasileiro de patentes, defasado em comparação aos dos países que competem com o Brasil por investimentos.
Primeiro a palestrar, o advogado Otto Licks, sócio do Licks Attorneys, apresentou as principais inovações trazidas pelo PL 2056 e afirmou que ele é positivo ao introduzir na legislação uma fórmula para compensar os atrasos na concessão de patentes pelo INPI, em total consonância com a lei que rege o processo administrativo federal e com as diretrizes estabelecidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento da ADI 5529 em 2021.
“A compensação é positiva. Ela reduz os preços dos produtos porque, quanto menor o prazo de proteção, mais o titular da patente tem que cobrar para conseguir reaver seu investimento. Quanto menor o prazo, mais caro fica para o consumidor, mais difícil a negociação de licença, mas difícil é trazer a produção para o Brasil”, explicou Otto. “O espaçamento desse prazo é positivo e é percebido assim por diversos países do mundo. A maioria deles possui um sistema de compensação de prazo de patentes conhecido como PTA (Patent Term Adjustment).”
O advogado apresentou ainda um histórico comparativo dos pedidos de patentes de invenção das indústrias de telecomunicações, elétrica e eletrônica e das indústrias de ciências da vida, em especial as de fármacos e biofármacos. Os dados mostram que o primeiro segmento é o maior cliente do INPI: dos cerca de 100 mil pedidos de patentes que agradam uma decisão da autarquia, pelo menos 21 mil são da indústria de eletro e eletrônica, contra 14 mil da indústria de ciências da vida.
“Infelizmente muito da política do sistema de patentes brasileiro é capturada por um debate em torno das patentes de medicamentos, que são importantes, mas numericamente muito pouco expressivas. Nós precisamos evoluir para uma política de patentes que leve em consideração a importância que o sistema tem para a maioria dos usuários e não ter um debate capturado principalmente pela indústria dos genéricos”, afirmou Otto Licks.
Segundo a palestrar, Jonas dos Santos, analista legislativo da Câmara dos Deputados há 20 anos e vice-presidente da Comissão de Propriedade Intelectual da OAB-DF, detalhou o caminho que o PL 2056/22 deve percorrer na Câmara e no Senado até virar lei. O texto foi apresentado pelo deputado Alexis Fonteyne (NOVO/SP) em 14 de julho passado e o fato de o autor não ter sido reeleito não faz com que seu projeto seja arquivado, explicou Jonas. “A Câmara decidiu, há cerca de um mês, que os projetos de lei têm validade de até três legislaturas, ou seja, 12 anos. O deputado que apresentou o projeto não se reelegeu, mas, do ponto de vista técnico regimental, o PL segue seu trâmite, ele foi distribuído a três comissões”, afirmou o analista legislativo. Atualmente, o PL 2056 está na Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público. Ele ainda será analisado pela Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços e, finalmente, pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.
Já Celso Albuquerque, professor doutor de Direito Constitucional, membro do Grupo de Pesquisa em Propriedade Intelectual da UNIRIO e Procurador Regional da República, destacou que o PL 2056/22 tem o mérito de enfrentar uma realidade recente, que foi o surgimento de medidas judiciais buscadas em tribunais de outros países visando cercear a discussão em jurisdições brasileiras.
“O artigo 219 da nossa Constituição diz que o mercado interno será incentivado para, entre outras coisas, promover e garantir a autonomia tecnológica do país, e o direito patentário está bastante relacionado a isso. Já o artigo 170 trata dos princípios da ordem econômica e o primeiro deles é o princípio da soberania nacional, atributo essencial do Estado. Do ponto de vista externo, significa igualdade entre os Estados, e não subordinação, como se pretende com essas ações judiciais no exterior”, explicou Albuquerque.
O professor de Direito da UNIRIO e do programa de Mestrado em Direito da UCAM (Universidade Cândido Mendes), Ricardo Sichel, destacou que os números de propriedade intelectual do país estão em queda nos últimos anos. Sichel, cuja tese de titularidade na UNIRIO mostra como a insegurança jurídica é entrave ao desenvolvimento do sistema de propriedade intelectual, destacou que menos de 50% dos pedidos de patentes e de marcas da América Latina são feitos no Brasil, embora o país tenha o maior PIB da região.
“Um marco muito interessante é o que se observa na China, onde estão dando mais importância à pesquisa, à indústria. Tanto é que a lei chinesa, numa das últimas mudanças, propôs a alteração e ampliação do prazo de proteção de patentes. Isso acaba gerando uma consequência direta de na China ter um milhão de pedidos de patentes e o Brasil um pouquinho menos de 25 mil. Sendo que a curva brasileira é decrescente e não ascendente”, concluiu Sichel.